" a última dança / epitáfio "






as folhas desciam lentas
outononando*se

dançavam com a brisa o último bailado
e já no chão, cumpriam sua derradeira pena
espezinhadas sem remissão

alheados à nudez das árvores
ao céu cinzento, aos raios e trovões
todos seguiam ao compasso da chuva
como cumprindo um deus * Tiino 
e curvados em suas vestes escuras
prestavam-se ao exorcismo da procissão

em fila organizada e cantante
oravam como se para si pedissem perdão
embora não fosse a sua hora
só de pensar que um dia seria
tornava tudo tão angustiante

a via repleta de velas erguidas
suportadas por mãos em negação
previa de antemão, que nada os poderia parar
uns o faziam porque sim, outros por desgosto
mas mais eram os que cumpriam por obrigação

e ele...
tal como as folhas que outonavam, 
e na última dança foram de encontro ao chão, 
já não os ouvia na sua lenga lenga por salvação

chegou a pensar que subiu
mas nada se parecia com o céu
lentamente desceram-no
e a cada lance mais escuro
outro e outro lhe sucedeu

e veio-me à memória
seus olhos verdes brilhando
com os últimos passos de dança imaginados
ao som do "epitáfio" dos king Crimson
estendeu a mão a uma folha amarelada
que caía para lá da janela envidraçada
como se fosse possível tocá-la
aí, nesse momento percebeu como estava frio
era a porta do inverno permanente
e do inferno penitente  

oh, como ele tentou
mas sem forças para a última dança que não dançou
despediu-se e deixou uma folha
uma folha em branco amarelada pelo tempo
onde nada estava escrito e no entanto tudo contava
era uma folha de ensopar almas em desassossego
húmida de ais e no verso um alegre raio de luz

viu-se um clarão que antecedeu o silêncio da procissão
era o nada, a cegueira

o medo que  vem de cima
mexeu com os sentidos
o sangue gelado os percorreu

não houve cova, nem caixão
nem o ruído que se conhece 
da queda de cada torrão

emudeceu-se a fanfarra
de notas floreadas
que o transportariam
à última...
única...
e possível, morada

os degraus levavam 
ao que lhe recebeu as cinzas
um mar manso, um mar chão 
.
Guma




 autor 📝📸 : Guma © 2009 / 2023

☮️


Comentários

Manuela disse…
Lindo demais, obrigada pela partilha,
Guma disse…
Eu é que agradeço Manuela!
Roselia Bezerra disse…
"Na noite natalina lembremo-nos dos sofrimentos de tantos pequeninos e peçamos a Deus que Ele tenha compaixão. Na noite em que Jesus nasceu os anjos cantaram Glória. Alegrem-se e, como os anjos, rendamos graças ao nosso Deus."

Amigo Guma, boa tarde de antevéspera de Natal!
Feliz e abençoado Natal para você e sua família!
Abraços fraternos com carinho de gratidão e estima
Guma disse…
Muito obrigado Roselia.
Meu kandando acompanhado do sincero desejo Boas Festas, com saúde essencialmente, e sendo possível, seja festejado em reunião junto dos que ama.
Façamos todos a nossa parte e pela vida fora, não apenas por estas datas, para que este mundo seja mais justo socialmente, equitativo, tolerante, respeitando a vida e tudo o que o Universo nos proporciona. Precisamos de paz!
Um poema que é uma história.
Desejos de Natal Feliz, uma noite luminosa e cheia de estrelas.
Um abraço.
Um Bom Dia de Natal.
Guma disse…
Agradeço e é meu desejo que o seja consigo e os seus - Um Feliz Natal!!
Kandando
Guma disse…
Já um Pouco adiantado mas dentro do espirito, agradeço e retribuo com amizade e estima.
Continuação de Boas Festas, com saúde e alegria.
Kandando

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